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Mata dos Godoy - Reserva londrinense será 'termômetro' das mudanças climáticas na Terra

Parque foi incluído no Programa de Pesquisa Ecológica de Longa Duração, uma iniciativa de monitoramento global da qual a UEL faz parte

Fotos: Celso Pacheco
Parcela da mata original sob o olhar dos pesquisadores: o homem tenta entender detalhes de como o bioma reage às alterações do clima
Qual o impacto das intervenções humanas e das mudanças climáticas globais nos ecossistemas de rios e florestas? Para responder a esta e outras questões essenciais à preservação de nossos recursos naturais, foram criados 31 sítios de referência para a pesquisa científica no Brasil, que são as áreas pertencentes ao Programa de Pesquisa Ecológica de Longa Duração (Peld).

A última área incorporada à rede internacional Peld é a do Parque Estadual Mata dos Godoy, por meio do sítio Mata Atlântica do Norte do Paraná (Manp), coordenado pelo Departamento de Biologia Animal e Vegetal da Universidade Estadual de Londrina (UEL).

Com recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), será feito a partir de agora o monitoramento permanente da área localizada na região Sul de Londrina, um dos mais importantes fragmentos de Mata Atlântica que ainda resistem no Estado. O diferencial do mais novo sítio Peld é a possibilidade de monitorar duas situações no mesmo local: uma área de floresta original e outra em recuperação.

"Nos outros sítios já existentes são monitoradas áreas bem conservadas, remanescentes, em que a biodiversidade está íntegra. Aqui, nossa proposta é monitorar uma área conservada, como a Mata dos Godoy, e uma em recuperação", explica o coordenador do Manp, professor José Marcelo Domingues Torezan, que também atua no Laboratório de Biodiversidade e Restauração de Ecossistemas (Labre).

A área em recuperação a que se refere o pesquisador é um reflorestamento iniciado em 1990, anexo à mata original. No passado, a vegetação ali existente foi destruída para dar lugar a pastagens, mas desde que o parque estadual foi criado, há 24 anos, fauna e flora vêm aos poucos reocupando seu antigo lugar. Ainda é bem visível a diferença entre a densidade desta área e a da mata existente a poucos metros dali. "Estudo feito na Serra do Mar concluiu que, para uma área de Mata Atlântica se recuperar totalmente pode levar uns 300 anos. Aqui na Mata Atlântica do interior este tempo pode ser ainda maior, não temos como precisar. O reflorestamento é apenas o pontapé inicial. Plantamos algumas mudas, cuidamos um tempo, e o resto é com a própria natureza", explica Torezan.

Alunos e professores da UEL realizam projetos no local desde que a mata pertencia à Fazenda Santa Helena, da família Godoy. De acordo com o coordenador do Manp, a ideia de monitorar as duas realidades e propor a criação de um sítio Peld ali surgiu da constatação de que este trecho de Mata Atlântica está "no osso".

"Tínhamos que olhar tanto para a área remanescente como para a área em recuperação, porque ela precisa existir diante do grau de degradação que chegamos. Não podemos desprezar uma fonte de aprendizado como esta para a ecologia, inclusive para entender o que está acontecendo diante das mudanças climáticas. Não sabemos como as matas remanescentes vão responder a estas mudanças. Precisamos estudar isso se quisermos conservar o pouco que sobrou", argumenta.

Para exemplificar, o professor lembra que no século 19, quando havia um desmatamento, a recuperação acontecia no clima do século 19. Agora temos uma recuperação sendo feita durante uma mudança. "É como criar um filho mudando de casa a toda hora. Não sabemos como vai ser a vizinhança, com quem essa criança vai conviver."

Torezan lembra que o momento é tão preocupante que pesquisadores já aceitam a possibilidade de intervir em casos extremos de degradação. "Antigamente acreditávamos que a natureza se virava sozinha e não tínhamos que fazer nada. Hoje chegamos ao ponto de admitirmos que pode ser necessário intervenção humana", revela, enquanto mostra a presença de capim africano na área em recuperação da mata. "Esta é uma espécie que evoluiu na savana, com seis meses de seca, manadas pastando e fogo de vez em quando. Ou seja: aqui, para este capim, é o paraíso. Quem o tira daí agora? Esta é uma realidade nova. O aumento do comércio global fez aumentar também a troca de espécies de um local para outro, gerando um fenômeno que se sobrepõe às mudanças climáticas e ao desmatamento", exemplifica o biólogo.

Outro aspecto importante da inclusão da Mata dos Godoy à rede Peld é a possibilidade de resgatar o histórico antigo de pesquisa da UEL no local e, a partir de agora, coletar as informações de forma padronizada e armazená-las em banco de dados público, de forma que qualquer pessoa possa acessá-lo e entendê-lo.

"Por exemplo, aqui já foram feitos quatro estudos de vegetação, em diferentes momentos, que não se conversaram. Queremos acabar com isso. Quem for estudar essa vegetação daqui para frente terá acesso aos dados já coletados e à localização exata das amostras. Assim, o pesquisador poderá dar um passo adiante, e não repetir o que já foi feito." No caso das aves, Torezan explica que a ideia é a mesma: armazenar os dados de forma padronizada, reconhecível, inteligível e disponível para todos.

folha de londrina
Silvana Leão
Reportagem Local
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